Barroso e Coelho Advocacia

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O Papel do Advogado no Acordo de Não-Persecução Penal

O intitulado “Projeto de Lei Anticrime” proposto no início da gestão do atual Ministério da Justiça e Segurança Pública apresentou uma série de propostas relativas às matérias de Direito Penal, Direito Processual Penal e Execução Penal.

Dentre as diversas possíveis alterações apresentadas, encontra-se especificamente no item XII, a introdução de soluções negociadas no Código de Processo Penal por meio da adição ao atual regramento do artigo 28-A.

Pretende o Ministro da Justiça e Segurança Pública que em não sendo o caso de arquivamento do inquérito, mediante confissão do investigado, tratando-se de delito com pena inferior a quatro anos e não cometido mediante violência ou grave ameaça, poderá o Ministério Público propor um acordo de não-persecução penal.

O dispositivo proposta apresenta um rol de condições para que o acordo de não-persecução seja efetivamente firmado, dentre elas: reparação do dano causada à vítima, prestação pecuniária, prestação de serviços à comunidade, entre outras que serão pactuadas e analisadas pelo juízo competente de acordo com as particularidades e necessidades de cada caso concreto.

Mas, nos chama a atenção o que consta no inciso de número V do proposto artigo:

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

O dispositivo aqui transcrito nos esclarece que as condições a serem firmadas com o investigado não precisam ser necessariamente as já prescritas legalmente, podendo o Órgão Acusador indicar condições que considere adequadas a imputação delituosa do caso em análise.

Todavia, tamanha discricionariedade por parte do Ministério Público reforça de maneira significativa a necessidade de uma postura ativa por parte do Defensor do investigado. A própria proposta nos traz, em seu §3º, a estrita obrigatoriedade de que um Defensor esteja presente e assine o termo de não-persecução em conjunto com o acusado.

Entretanto, esta presença não pode ser observada de maneira pro forma, sendo imprescindível que a Defesa do investigado intervenha de maneira incisiva nas formulações pretendidas pelo Ministério Público.

De certo que a formulação de condições compatíveis a cada caso permite uma melhor adequação a situação de cada investigado, e, por analogia reversa, se trataria de uma observância ao Princípio da Individualização da Pena (no caso, não-pena).

Mas, para que o acordo de não-persecução penal seja firmado de maneira reta e submetido a preceitos constitucionais, é necessário que o Defensor participe da elaboração destas condições, construa o termo em conjunto com o Ministério Público, impedindo-o de criar condições de cumprimento prejudiciais ao réu, ou, que venham a significar restrição à sua liberdade.

Outro ponto que merece ser reforçado é o fato de que o acordo de não-persecução deve, por óbvio, se tratar de iniciativa voluntária, não podendo o investigado ser induzido ou instigado a assinar tal termo, devendo o defensor do investigado zelar para que o magistrado competente certifique-se e averigue tal requisito.

As medidas propostas pelo atual Ministério de Justiça estão sendo constantemente atacadas por parte significativa dos juristas, sobretudo no que diz respeito ao acordo de não-persecução, alegando que se trataria de ofensa à Inafastabilidade da Jurisdição. Outras críticas a respeito do tema passam pela seara da Colaboração Premiada, alegando alguns juristas que tratar-se-ia o acordo de não-persecução de uma espécie de acordo de delação premiada simplificado.

De certo que, se a referida medida for implantada de maneira correta, significará celeridade e economia de recursos estatais, vez que diversos procedimentos penais são instaurados atualmente no país em virtude uma cultura punitivista completamente infrutífera.

Mas, repisa-se, para que venha a se tratar de uma proposta efetiva, é primordial que o investigado se valha de uma Defesa Plena, ativa quanto a elaboração das condições, sua forma de cumprimento e também no que diz respeito aos requisitos legais e preceitos constitucionais a serem observados.

A participação enfática do Defensor é absolutamente necessária na elaboração destes acordos, pois, caso a defesa se omita, pode o Ministério Público tornar-se ativo e abrangente de maneira exorbitante, acumulando-se de funções do próprio juiz.

A Resolução 181 do Conselho Nacional do Ministério Público já apresenta texto muito similar ao proposto pelo Executivo no referido Pacote Anticrime, ou seja, trata-se de uma prática já institucionalizada e estimulada pelo próprio Órgão Acusador.

Deve então o regramento processual do acordo de não-persecução penal ser estabelecimento de maneira esmiuçada, não deixando lacunas legais no tocante ao procedimento a ser seguido, que possam vir a significar prejuízo ao investigado.

Portanto, não pretende o presente texto se posicionar pela extirpação da medida proposta pelo atual Ministro, mas, atentar para a necessidade de observância do papel ativo do Defensor na elaboração e cumprimento dos acordos de não-persecução que vierem a ser firmados, pautando-se, sempre, em obediência aos princípios constitucionais estabelecidos em nossa Carta Magna.

FONTES:

https://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2019/01/08/interna_nacional,1019735/plea-bargain-de-moro-e-incompativel-com-legislacao-penal-dizem-advo.shtml - acesso em 11/05/19.
https://canalcienciascriminais.com.br/wp-content/uploads/2019/02/projeto-moro.pdf - acesso em 11/05/19.
http://www.cnmp.mp.br/portal/images/resolucoes/resolu%c3%a7%c3%a3o-181.pdf  -acesso em 11/05/19.