A nova tipificação penal: STF resolve punir com prisão aquele que não paga ICMS declarado
/No último dia 11 de Dezembro o Supremo Tribunal Federal, por maioria, entendeu se tratar de crime o não pagamento de ICMS declarado. Mas o que significa isso?
Os Ministros discutiram em plenário se o inadimplemento de ICMS (imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação) declarado pelo contribuinte deveria ser enquadrado como conduta criminosa, uma espécie de apropriação indébita, pautando-se para tal no inciso II do art.2° da Lei 8.137/90.
Por maioria, entenderam os ministros, que a cobrança e a posterior omissão de recolhimento pelo comerciante, implicariam em apropriação de valores de terceiros, apresentando tal fundamento como legitimador para a criminalização da referida conduta.
Assim, àquele empresário que deixar de repassar o tributo, ICMS, declarado ao fisco passa a incorrer em apropriação indébita, tendo em vista que o comerciante seria somente depositário dos valores recebidos.
Sim, tratou-se de verdadeira criação de tipo penal pelo Tribunal.
O primeiro ponto que deve ser destacado, e que por si só deveria derrubar o entendimento recentemente firmado é de que o inciso II do art.2° da Lei 8.137/90, não contempla a inadimplência do ICMS próprio.
Assim, tendo em vista que o tipo penal não contempla o referido tributo, estaria o STF legislando, criminalizando conduta.
Além de desvirtuar frontalmente a própria competência do Poder Judiciário, tendo em vista que a tipificação de condutas compete, única e exclusivamente, ao Legislador, o recente entendimento se mostra como mais um intento no sentido de utilização do Direito Penal como instrumento para cobrança de tributos.
A utilização do magistrado como agente do fisco corrói preceitos fundamentais ao Estado Democrático de Direito, atenta contra garantias constitucionais, como aquela disposta no artigo 5° LXVII que expressamente dispõe que não haverá prisão civil por dívida, e fragiliza a segurança jurídica do empreendedor, figura tão cara à nossa economia.
O entendimento firmado no último dia 11 de Dezembro reforça uma concepção enganosa e ineficaz do Direito Penal, que ao invés de se manter em seu devido e necessário escopo, irá se prestar ao papel de verdadeiro “cobrador” do Estado.
Como destacado pelo Ministro Relator Roberto Barroso, sido este acompanhado por mais quatro ministros que formaram a maioria, para punição do contribuinte deverá ser comprovado o dolo, ou seja, sua intenção de fraudar.
Todavia, por mais belo, e óbvio, que possa soar tal fundamento, esta distinção entre o contribuinte que de fato pretende fraudar o fisco e àquele que atravessa períodos de dificuldade, não será feita da maneira devida, observando o contexto de punibilidade exacerbada em que nos inserimos.
O discurso de combate à corrupção é constantemente estimulado, portanto a punição de “sonegadores” e “corruptos” se tornará cada vez mais corriqueiras, tendo em vista o constante atropelo de garantias constitucionais.
Portanto o que deveria se tratar de mero descumprimento de obrigação tributária, e, por conseguinte discutida em seara cível, passará a ter contornos criminais, submetendo diversos contribuintes à travessia de um processo penal de maneira injustificada.
No ímpeto estatal de combate a corrupção, crescentemente estimulado pelos governantes, membros do Ministério Público e magistrados, o papel do advogado mais uma vez se faz imprescindível, tendo em vista que neste contexto inquisitório, o afastamento do ímpeto doloso faz-se então necessário para comprovação da inocência do contribuinte”.