O que é multiparentalidade – e como eu posso ser registrado como pai ou mãe socioafetivo?
/Em 2019, o Supremo Tribunal Federal fixou tese de número 622, entendendo que “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios.”. Esse foi o julgado que pacificou o entendimento acerca da multiparentalidade.
A multiparentalidade é a possibilidade de que uma mesma pessoa possua mais de um vínculo paternal, independente do vínculo biológico, perante o ordenamento jurídico. Isso permite que as várias composições familiares possam ser protegidas pela lei.
O tema da multiparentalidade está intrinsecamente conectado com o da paternidade socioafetiva – o vínculo afetivo entre pais e filhos, sem o compartilhamento de genes. Assim, a partir do julgamento do Tema 622, uma criança pode ter em registro pais genéticos e outros afetivos, concomitantes.
Anteriormente, o registro de paternidade socioafetiva só poderia ser efetuado por vias judiciais. Com o Provimento nº 63, em 2017, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tornou possível que o registro fosse feito extrajudicialmente, no Cartório de Registro Civil.
Agora, com as alterações realizadas pelo Provimento nº 83, do CNJ, o registro de paternidade socioafetiva só pode ser efetuado por via extrajudicial se o casal não tiver se submetido à fertilização assistida e se a criança já possuir mais de 12 anos.
E o que isso altera? Para além do reconhecimento como pai ou mãe pelos olhos do ordenamento legal, para todos os fins jurídicos, será considerado pai e mãe. Em outras palavras, todos os direitos e obrigações previstos pela legislação também serão conferidos e exigidos do pai socioafetivo.
Dentre os principais direitos, o Código Civil elenca o direito ao convívio e o de participar das decisões relacionadas à criança, entre outros. Nas obrigações, tem-se o dever de manter a criança a salvo de perigos, o de educar e de orientar durante a infância e a juventude, e o de prestar alimentos.
Como não há diferença entre filhos genéticos ou socioafetivos, também não há entre os pais biológicos ou afetivos, devendo estes desempenhar o papel que deles é esperado.
Sobre a questão alimentar, é importante ressaltar que o dever de prestar alimentos é recíproco. Tanto o pai e a mãe devem contribuir financeiramente para o sustento dos pequenos, como podem destes receber quando estiverem na velhice, caso necessário. Por isso é importante a cautela nessa decisão, dado que isso implica em possível oneração futura dos filhos.
Além disso, realizada a alteração no registro, os direitos sucessórios também passam a ser aplicados. Isso significa que a partir de eventual morte de qualquer parte, o outro se torna herdeiro necessário. Herdeiro necessário é aquele que tem direito à parte legítima da herança – aquela de que o falecido não pode dispor livremente em testamento ou por doações em vida.
Outro ponto de cuidado é que o registro é irretratável, isto é, não pode ser desfeito. Uma vez que uma pessoa decide registrar-se como pai ou mãe socioafetivos, de forma espontânea, este ato não pode mais ser desfeito.
Portanto, é preciso que a decisão de se tornar mãe ou pai socioafetivo seja tomada com base em muito afeto e consciência, vez que interferirá na vida de todos por muito tempo. Contudo, é importante reconhecer como os vários formatos familiares que existem na sociedade atualmente estão conseguindo encontrar subsídio e reconhecimento legal, garantindo mais autonomia para que todos possam percorrer a sua felicidade.