Vou me casar, qual regime de bens eu escolho?

O casamento é marcado pela afetividade, mas produz vários efeitos jurídicos que repercutem no campo pessoal e econômico do casal. Todo matrimônio submete-se a um regime de bens para disciplinar a questão patrimonial, o qual pode ser escolhido livremente pelos noivos e pode, inclusive, ser alterado após o casamento, desde que atendidas as condições legais. 

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O Código Civil estabelece 4 (quatro) tipos de regime de bens, podendo os noivos, quando da habilitação para o casamento, perante o cartório de registro civil, optar por um deles, através do pacto antenupcial, lavrado por escritura pública e registrado perante o cartório de imóveis do domicílio dos noivos para surtir efeitos perante terceiros.

O pacto antenupcial nada mais é do que um contrato celebrado entre os noivos, previamente ao casamento, para definir algumas questões patrimoniais.  Além da escolha do regime de bens, podem ser pactuados outros assuntos, como doações entre os cônjuges, doações para terceiros, compra e venda, cessão de direitos, permuta, comodato, usufruto, uso e destino dos frutos decorrente da aquisição de bens já existentes. 

Importante registrar que, considerando o direito ao livre planejamento familiar, consagrado constitucionalmente, o pacto antenupcial pode conter cláusulas existenciais, desde que não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar.

Regime de comunhão parcial de bens: “o meu, o seu, o nosso”

Atualmente, não havendo escolha do regime de bens pelos noivos, por meio do pacto antenupcial, o direito brasileiro estabelece como regime supletivo o da comunhão parcial de bens.

Nesta modalidade, entram na comunhão todos os bens adquiridos na constância do casamento, a título oneroso, como a compra e venda, e a título eventual, como loteria e prêmios, excluindo-se aqueles adquiridos antes do matrimônio e por título gratuito, como herança e doações, individualmente, e não em favor de ambos.

 Em outras palavras, “o que adquiri antes de me casar com você é meu, o que você adquiriu antes de casar comigo é seu, e o que adquirimos durante o casamento é nosso”, de modo que cada um tem direito a meação, isto é, metade do patrimônio construído, ainda que o bem esteja apenas no nome de um dos cônjuges.

 Também irão se comunicar as benfeitorias dos bens particulares, como reformas, acréscimos e melhoramentos realizados nos imóveis particulares, e ainda, se comunicam os frutos dos bens comuns e particulares, como os aluguéis e rendas de aplicações financeiras. 

Por outro lado, excluem-se da comunhão os bens adquiridos com valores pertencentes exclusivamente a um dos cônjuges e os sub-rogados em seu lugar, isto é, aqueles adquiridos com recursos advindos de bens particulares. Por cautela, recomenda-se que conste expressamente na escritura pública ou no contrato a sub-rogação.  Ademais, os bens de uso pessoal, livros, material de trabalho, salários, pensões, aposentadorias também não entram na comunhão.

Com relação às dívidas, aquelas contraídas antes do casamento não se comunicam, nem as provenientes de algum ato ilícito, por exemplo, condenação por danos morais ou materiais.  Por óbvio, aquelas contraídas pelo cônjuge em benefício próprio e as provenientes da administração de cada um em relação aos seus bens particulares também não se comunicam.

Neste ponto, cabe destacar o instrumento jurídico dos embargos de terceiro, utilizado para a defesa da meação, quando a penhora recair sobre o bem, quando um dos cônjuges não responder pela dívida executada.

Regime de comunhão universal de bens: “tudo é nosso”

Nesse tipo de regime, como o próprio nome diz, abrange toda a universalidade do patrimônio, não existindo bens particulares, ainda que adquiridos antes do matrimônio. Esse era o regime legal e supletivo adotado pelo direito brasileiro até a lei do divórcio de 1977.

Porém, alguns bens são excluídos da comunhão, como aqueles adquiridos por meio de herança ou doação, gravados com cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em lugar dos recebidos com tal cláusula, além dos bens de uso pessoal, livros, material de trabalho, salários, pensões, aposentadorias.

As dívidas contraídas antes do matrimônio também não se comunicam, salvo aquelas decorrentes do próprio casamento. Todavia, as dívidas provenientes de atos ilícitos entram na comunhão.

Regime de separação convencional de bens: “o meu e o seu”

Nessa modalidade, ao contrário da comunhão universal, há uma separação total de bens, caracterizando uma independência absoluta quanto a bens e obrigações de cada cônjuge. Conseqüentemente, a administração patrimonial é individual e cada um responde pelas suas dívidas.

A separação convencional costuma ser utilizada por casais que já possuem patrimônio próprio antes do matrimônio e por aqueles que exercem profissão com riscos financeiros, como os empresários, por exemplo.

Culturalmente, as pessoas não costumam ver com bons olhos quem decide escolher tal regime, como se houvesse menos afeto, o que não é verdade. Ao contrário, evidencia-se a falta de interesse material na relação, salientando ainda mais o amor.

Ademais, nada impede que sejam adquiridos bens em conjunto durante a união, constando o nome de ambos e a porcentagem de participação de cada, havendo um condomínio entre o casal.

Regime de participação final dos aquestos: “o mix da separação e da comunhão parcial de bens”

A participação final nos aquestos mistura regras da separação convencional e da comunhão parcial de bens. Durante o casamento, cada cônjuge possui seu próprio patrimônio, com administração livre, porém, havendo a dissolução, haverá a partilha da metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso.

Os bens a serem partilhados serão apurados e calculados após a dissolução, por meio de uma reconstituição contábil dos aquestos. Vale lembrar que a dissolução do casamento não ocorre apenas pelo divórcio, mas também pela morte.

O direito à meação não admite renúncia ou cessão, sendo impenhorável, na constância do casamento, de modo que o cônjuge pode apresentar embargos de terceiro para proteger a sua meação.

Separação obrigatória de bens: “Pode ser uma pegadinha”

Em algumas hipóteses, o direito brasileiro limita a autonomia privada dos noivos, para impor o regime de separação, visando proteger certas pessoas e situações. Tais hipóteses consistem em: violação das causas suspensivas do art. 1523 (viúvos, enquanto não fizerem o inventário e partilha; divorciados enquanto não decidida a partilha de bens; tutores e curadores e seus descendentes, enquanto não saldadas as respectivas contas); quando um dos noivos tem mais de 70 anos de idade; quando um dos noivos depende de autorização judicial para casar (suprimento de idade ou de consentimento).

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Na separação obrigatória de bens, os cônjuges não podem estabelecer sociedade entre si e não precisam de autorização do outro para venda de bens aos descendentes. Em princípio, também não haveria mistura patrimonial, nem partilha de bens comuns. Mas cuidado, pois a súmula 377 do STF, editada antes do atual Código Civil de 2002, continua em vigor. Segundo ela: No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento. Portanto, no caso do rompimento do vínculo conjugal, os efeitos serão os da comunhão parcial.

Desse modo, cabe aos nubentes estipular o regime de separação convencional de bens por meio de pacto antenupcial, a fim de que sejam garantidos os efeitos do regime de separação de bens e seja afastada a aplicação da referida súmula, conforme enunciado 634 do CJF. 

Conclusão

Geralmente, as pessoas não buscam orientações de um advogado antes de se casarem para sanar dúvidas a respeito do regime de bens a ser escolhido, o que pode se tornar um problema caso haja o divórcio. Isso porque embora amor e patrimônio não se confundem, os dois andam juntos e misturados em um casamento.

O melhor regime de bens irá variar, conforme as peculiaridades de cada casal, em especial, quando um deles está em processo de divórcio, inventário, pretende empreender, ser sócio de uma empresa ou se já o é. 

Sendo assim, não procure um advogado apenas para divorciar, seja cauteloso, procure um advogado também antes de casar, estudar a escolha do regime de bens, por meio de um pacto antenupcial, configura-se um planejamento financeiro, que pode evitar problemas no futuro.