5 dúvidas de toda testemunha em um processo criminal
Se você encontrou este artigo na internet, é bem provável que tenha sido intimado para comparecer como testemunha em uma audiência criminal. Quem se encontra em uma situação como esta muitas vezes fica ansioso, com medo de alguma repercussão negativa.
O imaginário popular contribui para o nervosismo, já que é do processo criminal que sai o enredo dos melhores filmes, novelas e seriados. Daí, mais do que para qualquer outro tipo de Vara, a pessoa intimada a comparecer na Vara Criminal, imediatamente é tomada por pensamentos como “criminal é coisa séria”, “pode dar cadeia”, ou “vai que me acusam de alguma coisa?”.
E muitas vezes quem é chamado a prestar depoimento, não sabe se vai precisar de um Advogado Criminal, ou não tem tempo de encontrar um. O Google parece uma excelente alternativa nessas horas.
Pra você que está tentando diminuir a angústia com essa obrigação, vamos explicar os 5 pontos da audiência criminal de oitiva de testemunhas que geram mais dúvidas. Continue a leitura e descubra!
1. Quem pode ser testemunha?
Toda pessoa pode ser testemunha e, em regra, é obrigada a comparecer. Então o cidadão chega para ser ouvido, informa seus dados, promete dizer a verdade e começa a ser questionado.
Mas para algumas pessoas, a lei deu um tratamento diferenciado quando estão na posição de testemunhas.
São os doentes e deficientes mentais; os menores de 14 anos; e os parentes próximos da pessoa que está sendo investigada/acusada. Todos eles estão dispensados de fazer aquela “promessa de dizer a verdade”, ou nos termos técnicos, de “prestar compromisso”.
Aliás, os parentes próximos – que para esse caso, trata-se de pai, mãe, irmãos, avós, filhos, esposa, sogros, enteados ou qualquer pessoa equiparada a eles – podem até se recursar a prestar depoimento, salvo se o testemunho deles for a única prova disponível.
Também existem algumas pessoas que são proibidas de depor em razão da profissão delas. É o caso de todas aquelas em que o segredo e a confiança entre o profissional e o cliente/paciente é parte essencial da função desempenhada.
Assim, profissionais como psicólogos, padres e advogados são proibidos de prestar depoimento. Essa proibição, porém, pode ser deixada de lado, se a pessoa interessada dispensar o segredo e o profissional concordar em depor
2. Qual a ordem das perguntas?
No procedimento comum, primeiro são ouvidas as testemunhas da acusação e depois as da defesa. Quem arrola começa perguntando.
Ou seja, se você foi “convidado” pela defesa, assim que o juiz colher sua identificação, passará a palavra ao Advogado Criminal de defesa, que irá lhe fazer uma série de perguntas relacionadas à causa.
Em seguida, será a vez da acusação, através do Promotor ou do Advogado da parte contrária (conforme o tipo de crime), fazer as perguntas que entender pertinentes.
Agora, se você tiver sido convidado pela acusação, a ordem se inverte: primeiro Promotor/Advogado de acusação e depois Advogado de defesa.
Em ambos os casos, a testemunha é perguntada diretamente pelo Advogado ou Promotor. Caso algum ponto não fique bem esclarecido, o Juiz também pode, ao final, dirigir-se diretamente ao depoente.
A ordem de quem pergunta é muito importante para as estratégias de defesa ou acusação. Por isso, o assunto frequentemente gera bate-boca entre as partes e até com o Juiz. A preocupação é que a testemunha seja de alguma forma influenciada ou que o magistrado usurpe as funções acusatórias, comprometendo sua imparcialidade.
Uma situação típica disso é quando o Juiz pergunta a testemunha, sobre os fatos, antes da acusação e defesa. Os tribunais, inclusive o Supremo Tribunal Federal em julgamento recente (STF. 1ª Turma. HC 161658/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 2/6/2020), vedam terminantemente a inversão. Fazem, contudo, a ressalva de que é necessário demonstrar a existência de prejuízo para o acusado.
Se houver prejuízo, o processo volta atrás e a testemunha tem que ser ouvida novamente. Não se assuste, portanto, se você for convidado mais de uma vez para prestar os mesmos esclarecimentos, na mesma causa, anos mais tarde.
3. O que pode ser perguntado?
Inicialmente o depoente é perguntado, pelo Juiz, sobre suas informações pessoais. Nome, idade, endereço, profissão e tudo mais que servir para identifica-lo é solicitado pelo magistrado. Além disso, a testemunha é questionada sobre seu relacionamento e/ou grau de parentesco com o Réu. Isso tudo é importante, também, para verificar se a pessoa não se enquadra em nenhuma daquelas hipóteses de recusa, impossibilidade ou proibição de prestar depoimento, da 1ª dúvida.
O juiz, então, colhe o “compromisso” da testemunha, que basicamente é “sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado”.
Em seguida, são formuladas perguntas sobre a causa, na ordem que tratamos no item anterior. Basicamente, qualquer coisa pode ser perguntada, mas o juiz pode rejeitar três tipos de perguntas:
• as que puderem induzir a resposta;
• as que não tiverem relação com a causa; ou
• as que importarem na repetição de outra já respondida.
O Advogado Criminal, o Ministério Público, o Juiz ou até mesmo a própria testemunha podem alegar que a pergunta feita está recaindo em alguma dessas hipóteses. O Juiz analisa a alegação e, se concordar, interrompe a pergunta e/ou não deixa que ela seja registrada.
Por outro lado, se ficar claro que a pessoa não tem qualquer relação com o que está sendo perguntado e não souber de nada que interesse à causa, será dispensada pelo Juiz.
Ainda, a testemunha não pode manifestar suas opiniões pessoais, salvo se questionada.
4. E o direito de permanecer em silêncio?
Essa é uma confusão muito comum. A testemunha chega na audiência e invoca o direito de permanecer em silêncio. A ênfase com que algumas pessoas reclama essa prerrogativa parece até ter uma inspiração hollywoodiana...
Realmente é um protesto bem característico dos procedimentos criminais norte-americanos. E nós até temos esse mesmo direito aqui no Brasil, mas ele é exclusivo para o acusado. Quem é testemunha tem o dever de responder todas perguntas que lhe forem feitas.
O que pode tornar a situação complexa é se a resposta que a pessoa der, enquanto testemunha, puder incriminá-la de qualquer forma.
Neste caso, é preciso muito cuidado para que a própria negativa não seja vista como um crime em si (conforme veremos a seguir). Ou que a pessoa, explicando que opta por não responder, acabe criando um indício contra si em outra ação penal.
É especialmente importante estar acompanhado por um Advogado Criminal em casos assim. Até uma palavra mal interpretada ou fora de contexto pode trazer muita dor de cabeça para o depoente.
5. Posso ser preso?
Mais uma dúvida que tem respostas muito divergentes no imaginário popular.
Várias vezes ouvimos a história de alguém dizendo que um amigo foi prestar depoimento, mas acabou sendo preso, apesar do advogado ter garantido que era impossível haver prisão.
Primeiramente, em matéria de Direito, a palavra “garantido” é muito forte. Desconfie da pessoa que usá-la. É muito difícil garantir alguma coisa em um campo que depende de tantas pessoas, tantas interpretações e tantos procedimentos. As vezes um Advogado pouco experiente, ou querendo tranquilizar a testemunha, explica que a oitiva de testemunhas não é para tratar de fatos relacionados à ela, mas ao réu, e portanto ela não pode ser presa.
Em tese é assim mesmo que funciona. Em tese!
A verdade é que as situações reais costumam a trazer muitas complicações, de modo que a regra de que testemunha não vai presa, pode encontrar muitas exceções. Por isso, o medo das pessoas em prestar depoimento criminal tem lá seu fundamento.
Se a testemunha vai presa, é porque “algo deu errado”. Geralmente algo relacionado a um entre dois motivos: circunstâncias pessoais do depoente ou condução da audiência de oitiva.
Pode acontecer - e acontece - da testemunha ter um mandado de prisão em aberto ou até (acredite) estar em flagrante delito no momento em que comparece à Vara. Se alguma circunstância pessoal como esta for identificada no início da audiência, a praxe é de que o depoimento seja prestado e logo em seguida a pessoa seja conduzida pelas forças policiais.
O outro motivo é bem mais comum: é quando o depoente pratica algum comportamento ilícito durante a condução da audiência. Se for o caso de prisão, o Magistrado solicita o apoio da força policial, que faz a condução.
São muitos os ilícitos que podem ocorrer nesse cenário. Brigas com as partes, ou alguma forma de desrespeito às autoridades são causas recorrentes de detenção de depoentes.
Contudo, o ilícito mais frequente é o crime de falso testemunho. Esse delito do art. 342 do Código Penal, pune a testemunha que fizer afirmação falsa, negar ou calar a verdade. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, além de multa. Isso não significa que o depoente necessariamente sai da audiência preso, caso o magistrado entenda que ocorreu falso testemunho.
O procedimento correto é o Juiz, ao pronunciar a sentença, determinar o envio do depoimento supostamente falso à autoridade policial, para instauração de inquérito.
Todavia, já foram noticiados excessos em que a testemunha vai conduzida sob a “acusação” de falso testemunho, mas depois, formalmente, verifica-se que a motivação registrada foi desacato, desobediência ou outro crime supostamente ocorrido na oitiva.
A maior lição que se tem de situações como esta é a compreensão da dimensão de vulnerabilidade em que o depoente se encontra durante a audiência. Ser acompanhado por um Advogado Criminal, não é apenas questão de bom senso. É também, e principalmente, uma forma de proteção.